quarta-feira, 12 de novembro de 2008

A revolta da natureza








A revolta da natureza
29 de outubro de 2008

Lucia espiou o carro de Lourdes estacionar atrás do seu, na garagem. Passava pouco das dezenove horas.

Sua irmã viera visitá-la como de costume, às quartas-feira.

Os minutos passavam, entretidas estavam numa descontraída conversa, quando, de surpresa, um forte vento fez a porta da cozinha bater. Da janela, observaram o céu fechar-se num cinza muito escuro. Preocupadas, comentaram sobre temporais nessa época do ano em que o clima é de temperatura alta.

Lúcia aguardava a ligação do filho que jogava futebol no inter-classes da escola.

Seus olhos se fixaram no céu, nas pesadas nuvens, enquanto Lourdes anunciava-lhe previsão de temporais para a região, segundo o jornal local.

O tempo nublado e a temperatura elevada deixou o clima abafado durante todo o dia em que as janelas da casa estiveram abertas em busca do quase impossível ar ou vento.

O telefone tocou, respiraram aliviadas, o jogo havia terminado. Ela conseguiria pegar o filho antes que a chuva chegasse. O céu fechava-se, completamente.

A chuva viria, não havia mais dúvidas. Assim que ela recolocou o carro na garagem as rajadas de ventos aumentaram.

O sossego acabou ali.

O forte vento trazia a voz da natureza enfurecida pelos desmatamentos, queimadas, poluição dos rios e desinteresse do homem pelo meio ambiente. Podia-se sentir a chegada do temporal como uma vingança progressiva.

Fazia pouco que a decoração do fundo da casa ficara pronta. O toldo protegia a varanda onde uma televisão, sobre a parede, acrescentava a área de lazer o devido prazer almejado pela família nos finais de semana.

Cadeiras, mesa, espreguiçadeiras, chaise para banho de sol e alguns vasos com plantas completavam o ambiente que a fúria do vento, nesse dia 29 de outubro de 2008, fez questão de deslocar do lugar, com extremo prazer.

Relâmpagos e chuva pesada foram companhia inseparáveis àquele quase tufão que se prenunciava.

As árvores na rua balançavam descontroladas e seus galhos iam se desprendendo como se desfolheados com bem-me-quer, mal-me-quer.

A sala de estar, toda em vidraça e de frente para a varanda, piscina e edícula, naquele momento, fechada, sofria a pressão da ventania e da chuva.

De repente, ouviu-se forte barulho vindo do piso superior. Dois vasos com flor de fícus, na varanda dos quartos, jaziam no chão, espatifados.

O cesto para coleta de lixo, no hall da saída de serviço, voava a esmo, como uma pipa. De repente, ele sumiu da visão.

O gancho que mantinha o toldo da varanda fechado foi arrancado do chão, liberando a cortina que se lançou para todos os lados, chocando-se contra a televisão, já sem a capa de proteção, levada pela tempestade para algum lugar impossível de ser detectado. O toldo tanto foi jogado de um lado para o outro que se desprendeu do suporte. Ao final daquele enorme susto estava ele todo rasgado e enrolado em si mesmo.

Os vasos de flores da varanda tinham sido jogados contra a parede. Cacos e terra espalhados por toda a parte. Para deleite do vento e da chuva a terra grudara de forma considerável nas vidraças.

Ao final da tempestade,o teto da varanda estava tomado de terra. As plantas? Esfaceladas.

As cadeiras e a mesa jogadas em cantos diferentes do jardim e só não foram arremessadas para a rua porque a cerca viva de murtas as seguraram.

Foi com muita tristeza que se observou, a cada relâmpago, assim que o vento amenizou e já sem energia elétrica, a cobertura em lona sobre a edícula, toda ela deformada, como se estivesse cansada de lutar contra aquela tempestade. As ferragens quase sucumbiram à força do vento, inclinadas.

Algumas outras plantas foram destruídas ao serem arrancadas do chão, mas com o escuro da noite ficou difícil dimensionar o tamanho do estrago.

A energia não voltou naquela noite. As linhas telefônicas de celulares só voltaram a funcionar no dia seguinte.

A natureza, na manhã seguinte, parecia envergonhada ou disposta a fazer de conta que nada acontecera ao dar de presente à cidade um céu claro, apesar do sol escondido.

Pelas quantidades de árvores caídas pelas calçadas, galhos pelas ruas, letreiros desprendidos e suspensos no ar, casas destelhadas, vidraças quebradas e muita sujeira no geral, podia-se saber que a natureza devolvia o descaso, desprezo e maus-tratos recebidos.

Apesar dos tantos danos materiais sofridos, os danos pessoais tinham sido mínimos. Era preciso atentar para isso! Era tempo de começar a pensar no meio ambiente, com urgência!

Lucelena Maia
São João da Boa Vista / SP
30 de outubro de 2008

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